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Imersão no cerrado - o fogo e a luz

Atualizado: 30 de jun. de 2021

Na manhã ensolarada do dia 20 de maio, aniversário da nossa capital Palmas, um belo dia para iniciar a nossa segunda jornada de pesquisa do Projeto Cerrado em Cores. E como programado, por volta das 8h30 seguimos rumo a TO 010, em direção a cidade de Lajeado.

No percurso, ora ladeados por belas paisagens do cerrado tocantinense, ora áreas já devastadas pela ocupação humana. Por volta do KM 20 decidimos entrar em uma estrada de terra, na placa de entrada da propriedade estava escrito condomínio Madri, seguimos nessa estrada em direção ao lago de Palmas. Percorremos cerca de 3 km até fazemos a primeira parada.


Paramos próximos a uma pequena vereda que havia sido queimada na margem da estrada. A imagem e o contraste entre a vegetação queimada, a vegetação seca e as gramíneas verdes era uma cena peculiar e surreal da ação predatória do homem na natureza. Testemunhamos o efeito devastador do fogo, pois tentamos adentrar a mata pois aparentemente era só uma faixa de área queimada, mas mesmo entrando uns 15 metros mata a dentro o fogo havia devastado tudo naquele local. Não podemos confundir o fogo que o cerrado necessita e fortalece seu sistema, com o fogo indiscriminado causado pela ação da sociedade.

Mais a frente, vimos um pequeno curso d'água, e então decidimos explorar um pouco mais a verde e húmida vereda. Predominantemente composta em sua maioria por gramíneas de baixo porte, sua configuração levava os olhos até uma pequena fonte de água. Nesse momento lembramos o porque que o Cerrado é carinhosamente chamado de "Pai das águas" e da sua importância para a manutenção dos recursos hídricos no Brasil. Imagens abaixo a Crotalaria sp. (fig. à esquerda), Peixotoa sp. (fig. ao centro)

Tão próximo a área que sofreu com a queimada vimos a Mimosa skinneri Benth (abaixo a esquerda), a Stylosanthes capitata Vogel (centro), e a Cyperus sp. (direita). E nos deu um sentimento de fragilidade da natureza em relação ao homem, pois essas pequenas e preciosas plantas poderiam naquele momento terem morrido caso o fogo chegasse ate elas. E por esse tipo de ação, que o cerrado tem uma grande quantidade de áreas totalmente devastadas, temos inúmeras plantas encontram-se em risco de extinção, "do total de 7800 espécies do cerrado, 259 são oficialmente consideradas ameaçadas de extinção"1.

Após exploramos a vereda nos abrigamos na sobra de um Faveira-de-bolota (Parkia Platycephala) para imprimir folhas com a técnica de monotipia. Eram folhas colhidas de um Paratudo (Tabebuia aurea). A casca dessa planta é utilizada popularmente como remédio para problemas no estômago, vermes, diabetes, inflamações e febres. Ali, abrigados do calor intenso, naquela sobra da Faveira, fazemos as impressões. Além das folhas colhidas do Paratudo utilizamos apanhadas do chão. Esse processo de impressão de monotipias nos ajudou a refletir sobre a importância da identificação e do registro, pois a sensação de extinção pelo avanço do homem da natureza, ainda era muito latente em nós.

Uma paisagem contemplativa nos aguardava poucos metros adiante, uma bela vistas do lago da Usina Hidrelétrica, emoldurado pelas árvores típicas desta savana. Paisagem de fisionomia característica das árvores de pequeno a médio porte com seus caules tortuosos, possibilitando o sombreamento das plantas rasteiras. Mais adiante decidimos adentrar em um trecho de cerrado com vegetação mais agrupada e com árvores mais altas. Foi um processo de descoberta e de encantamento pela diversidade de formas e cores que a natureza proporciona.

Seguindo então, nos deparamos com o típico campo cerrado onde predomina a "vegetação herbácea e subarbustiva, embora nele também exista certa quantidade de árvores e arbustos"2. Já no início da nossa imersão percebemos uma grande variedade de plantas arbustivas, com folhagens incrivelmente belas, algumas retorcidas, outras perfuradas, manchadas, com nervuras etc. As folhas haviam sido atacadas por fungos percebido pela grande quantidade de manchas em tons marrons avermelhado e também foram devoradas por insetos, possivelmente por lagartas que causaram buracos nas folhas nos chamou atenção por lembrar uma renda.

As manchas se tornaram mais atraentes nas folhas do e Murici (Byrsonima verbascifolia), com suas folhas onduladas e manchadas. Imagens abaixo:

Mais adiante vimos também alguns frutos, da família da palmeira Syagrus sp. (a esquerda) e da Alibertia sp. (centro), a direita Ananas sp. Esses frutos nos fez pensar sobre a diversidade de frutas que o cerrado possui e de como não só animais mais também algumas populações se servem deles como alimento.

Nos chamou muito atenção as folhas secas no chão, verdadeiras rendas arquiteturais e delicadas. Fizemos a coleta delas, e colocamos em um fundo escuro pra que ajudar a fotografia e tentar captar a delicadeza delas. O chão era como um mar de folhas, com tons que iam do castanho avermelhado ao ocre pardo. Aquelas folhas que antes ajudavam as árvores na sintetização da fotossíntese, continuam a sua jornada alimentando insetos e micro organismos que transformam e reciclam toda essa matéria se transformando em adubo, para mais uma vez retornar para as árvores e plantas em forma de alimento. É um ciclo perfeito e infinito, cheio de conexões delicadas e frágeis que facilmente perturbamos com a nossa atuação.

Notamos uma menor ocorrência de floração em comparação à pesquisa de campo anterior. Mas as poucas que surgiram eram cheias de beleza e delicadeza. E observamos que em nossas andanças pelo cerrado, as flores que encontramos eram em sua maioria pequenas, frágeis e delicadas, umas mini joias que brotam em as adversidades.

Imagens abaixo: Davilla elliptica (esquerda), Pseudobombax longiflorum (Mart. & Zucc.) A. (centro), Crotalaria sp. (direita)

Desmodium sp. (esquerda), Dioclea megacarpa Rolf (centro), Cyanocephalus rugosus (direita)

Outro aspecto que foi muito latente para nós, foi a luz. A forma como os raios solares incidiam nas plantas, as nuances e formas que elas criavam, a vibração das cores em razão do brilho do sol, nos permitiu fazer os belos registros que vocês veem abaixo.

Em meio ao mato fechado encontramos um lajeiro aconchegante, para uma pausa na caminhada, debaixo de uma boa sobra, momento para uma pausa para o registro de umas plantas que havíamos colhido.

No caminho da volta, uma subida na estrada nos proporcionou essa privilegiada vista da Cerra do Carmo, e saímos dali com a certeza que havíamos nos conectado com a natureza e com esse riquíssimo bioma que é o cerrado.

Ainda animados com as possibilidades criativas oriundas da coletas das folhas e muito inspirados, fomo então fazer mais monotipias.

Foi a primeira que eu (Rossana) experimentei essa técnica (monotipia). Essa técnica consiste em aplicar tinta na folha, escolhemos a cor preta sob o fundo branco, no intuito de enaltecer as nervuras das folhas, e em seguida é colocada sob o papel e então. Escolhemos seis folhas distintas e fizemos cerca de cinco reproduções de cada. Em cada impressão obtivemos produz resultados completamente distintos de uma única planta, pois a cada transferência produz um resultado inigualável. O processo de e uma única folha execução, o fazer é muito prazeroso e satisfatório, sem falar no resultado que deixou todos nós encantados. Abaixo os pesquisadores Rossana e Vone executado a impressão.

Trata-se de um processo relativamente simples, não exige um grande nível de complexidade, mas o resultado é espetacular. Passamos a tarde fazendo impressões, o que nos rendeu mais de 30 gravuras, e finalizamos nossa expedição com essas belas obras, vejam abaixo algumas delas. A Dioscorea sp. com sua sua folha em forma de coração nos encantou com o seu formato. Apanhada já seca no chão tivemos que fervê-la para reidratar as fibras e evitando assim que ela se quebrasse no processo de impressão. Outra folha que também nos rendeu um belo registro foi a Leandra sp.. Sua rugosidade nos rendeu uma impressão delicada, que lembra pequenos craquelados e sua pilosidade fez com que a impressão lembrasse um desenho pontilista com nanquim.


GUIA DAS PLANTAS DO CERRADO. p.21

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